quinta-feira, 21 de outubro de 2010

A Herança Bolena, Philippa Gregory

.


.
A acção decorre na Inglaterra do século XVI, na corte do Rei Henrique VIII, tal como as duas obras anteriores da Saga Tudors (Catarina de Aragão – a Princesa Determinada e Duas Irmãs, Um Rei). Após a morte da sua terceira esposa, o rei decide casar-se com Ana, duquesa de Clèves. Nesta altura do seu reinado, Henrique detém o poder absoluto sobre tudo e todos em Inglaterra, tendo já condenado centenas de pessoas à morte, entre as quais a sua segunda mulher – Ana Bolena, e levado a cabo uma reforma religiosa que lhe permitiu romper com a Igreja de Roma, tornar-se chefe da Igreja Inglesa e detentor de toda a riqueza da mesma, tendo nomeadamente transformado dezenas de abadias e mosteiros em residências da Coroa. Não obstante, apenas tem um herdeiro do sexo masculino e tenta desesperadamente conceber mais um, receando pela continuação da sua dinastia. Vive rodeado por uma corte de nobres e servos, que permanentemente o adulam na esperança de arrecadar riqueza para si próprios e em que os homens mais poderosos do reino constantemente conspiram.
A história é-nos narrada a três vozes, por Ana de Clèves, Jane Bolena e Catarina Howard. Ana queria desesperadamente ser escolhida para noiva de Henrique, não se importando de casar com homem com idade para ser seu pai, não por ser o rei de Inglaterra mas por materializar a sua hipótese de sair da sua casa. Embora tenha detestado o rei assim que o viu (velho, gordo, doente) entusiasmou-se com as multidões de populares e nobres que vieram ao seu encontro para a saudar, com a riqueza do país. Revelou-se uma mulher bastante inteligente e pouco manipulável, ao contrário do que a sua timidez e o seu aspecto saloio (que chocava com as roupas extravagantes das suas damas) previam, aprendendo rapidamente a falar inglês e apercebendo-se do poder absoluto do rei sobre as suas rainhas – ainda nenhuma tinha saído com vida de um casamento com Henrique. Esta terrível constatação levou-a a colocar de lado o seu propósito de influenciar a Reforma da Igreja e concentrar-se apenas em não desagradar ao Rei. É uma personagem muito interessante, pois é bastante mais humana do que outras de livros da série anterior. Por exemplo, não possui a determinação inquebrantável de Catarina de Aragão, que daria a vida pelo trono de Inglaterra, nem a “indignidade” de Ana Bolena.
Jane Bolena é a cunhada de Ana Bolena e esposa do seu irmão Jorge. No livro anterior testemunhou contra Ana e Jorge, acusando-os falsamente de traição ao rei, o que lhe permitiu salvar a sua vida e a herança da família, que curiosamente acabou por ficar integralmente com a irmã de Ana. Após um período de afastamento foi colocada na corte pelo seu tio, o Duque de Norfolk, para servir a rainha e, claro, descobrir e transmitir ao duque todas as informações sobre a mesma. É interessante o facto de no livro anterior termos conhecido Jane apenas pela perspectiva de Jorge, Ana e Maria Bolena, que a desprezavam, e agora conhecermos as suas próprias impressões sobre si própria, a sua relação com os Bolena e os motivos que a levaram a traí-los. Claro que a mensagem é totalmente diferente e chegamos a ter dúvidas sobre quem estaria “mais correcto”.
Catarina Howard é mais uma das sobrinhas do duque de Norfolk que parecem nunca se esgotar e que ele introduz na corte para tentarem atraírem o rei e, assim, a riqueza. È, sem dúvida, a narradora mais irritante. Tem apenas quinze anos e é completamente idiota. É mesmo aquela mulher que só pensa em vestidos, completamente ignorante e sem nenhuma de vontade de aprender alguma coisa relevante. Para ela a corte é só festa e nem lhe passa pela linda cabecinha que existem conspirações perigosas e que nem todos os que parecem apoiá-la se podem tornar inimigos de um dia para o outro. O exemplo da tia Ana Bolena impressiona-a mas não lhe provoca o “clique” que deveria. Contudo, ao longo do livro fui-me afeiçoando a ela.
A minha primeira impressão (depois de ler quase metade) foi que o livro, apesar de os capítulos curtos e o avançar acelerado da acção me levarem a uma leitura compulsiva, não acrescentava muito aos anteriores: continuava interessante mas parecia que só mudava o nome da rainha, todas as conspirações e a vontade do rei em livrar-se de mais uma mulher eram mais do mesmo. Contudo, há medida que fui avançando o meu interesse aumentou e a história tornou-se terrivelmente interessante.
Apesar de ter adorado o livro fiquei com a sensação que se baseava na repetição de uma fórmula (ou que algo que eu li antes era repetição da fórmula deste, já que a ordem cronológica não corresponde à ordem por que a autora os escreveu). O final do livro leva-me a pensar que o seguinte da saga já vai ser mais radicalmente diferente, o que só me dá vontade de o ler o mais rapidamente possível.
Philippa Gregory é uma grande escritora de ficção histórica. Introduz nos seus livros importantes acontecimentos históricos sem os tornar maçudos. Estes acontecimentos estão de tal forma interligados com a vida das personagens que os lemos mais como fazendo parte da acção e não como uma adição de informação que torne o livro mais intelectual, ao contrário de outros em que a acção pára para dar lugar á informação histórica. Outra coisa interessantíssima nos seus livros é o modo como são narrados e as pessoas que põe a “falar-nos”.
Escusado será dizer que vou ler os restantes livros da série, e muito brevemente.
.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Timoleon Vieta Volta Para Casa, Dan Rhodes

.

.
Cockroft é um velho compositor inglês que apesar de, no passado, ter criado algumas canções para programas televisivos de êxito, cujos direitos de autor lhe garantem a subsistência, foi excluído da maioria dos círculos sociais e mediáticos que frequentava, após um incidente com a comunicação social. Emigrou para a Toscana, onde comprou uma agradável casa. Aí entra em franca decadência, tendo por companhia apenas Timoleon Vieta, o seu amado cão de olhos grandes ou um ou outro jovem que, ocasionalmente, aloje em sua casa, a troco de favores sexuais.

Um dia chega a sua casa um jovem que se apresenta a si próprio apenas como “O Bósnio”, que mantém á sua volta uma atmosfera de mistério e por quem Cockroft se apaixona. Este Bósnio imediatamente começa a odiar Timoleon Vieta, acabando por convencer o antigo compositor a expulsá-lo. Este, que apesar de amar o cão tem receio de ficar novamente só, resolve abandoná-lo em Roma, cidade onde considera que ele poderá subsistir bem sozinho e, quem sabe, apreciar a sua liberdade. Acontece que o cão não “pensou” da mesma maneira e determinou-se em regressar a casa, caminhando meses em direcção ao norte da Itália.

Dan Rhodes (autor inglês que desconhecia completamente) tem um estilo muito peculiar e conta uma grande história através de pequenos pedaços de texto equivalentes a contos, que não aparecem cronologicamente na obra. Desta forma, revela-nos o passado do compositor e do seu companheiro e, paralelamente, a longa caminhada de Timoleon Vieta, na qual este se cruza com diversas personagens, cuja história nos é também contada e nas quais Timoleon intervém inconscientemente.

O livro é estranho e bastante diferente das minhas leituras habituais.Foi uma experiência positiva precisamente por ser diferente, embora não para melhor. Não tendo a capacidade de me fascinar não é de forma alguma um livro maçudo ou desinteressante e, em alguns momentos, a saga de Timoleon comoveu-me.

.


Nota: não está traduzido para português de Portugal. Li uma edição brasileira.
.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

A Paixão Secreta do Inquisidor, Nerea Riesco

.


.

Acabei de ler A Paixão Secreta do Inquisidor, Nerea Riesco. É a autora espanhola que escreveu "No País das Borboletas", que eu adorei.

Deste também gostei bastante. Passa-se no norte de Espanha, no século XVII. Conta a história de Mayo, uma rapariga ingénua que procura incessantemente a sua amiga Ederra, presa pela Inquisição. A sua única pista é o inquisidor Salazar, que segue a uma distância discreta. Paralelamente é-nos contada a história deste inquisidor, que secretamente perdeu a fé em Deus. Aceitou a missão de viajar até ao Norte, assolado por supostos ataques de “bruxas”, pois a sua única esperança é encontrar provas de que as bruxas, mulheres que entregam a sua alma ao Diabo em troca de poderes mágicos e que se dirigem de noite em vassouras voadoras e reuniões secretas com a sua seita, de facto existem. Se Salazar conseguir encontrar provas da existência do Diabo, então saberá que Deus também existe e poderá reencontrar o conforto espiritual de que usufruíra na sua juventude. Contudo, até agora, apenas encontrou embustes, acusações movidas por imaginações prodigiosas e por invejas, em que os seus colegas acreditam, condenado pessoas inocentes á morte pela fogueira.
Este espírito de “mata que é bruxa” também predomina na população. A intolerância em relação aos suspeitos de bruxaria é total. Só para terem uma ideia vou colocar aqui uma passagem que me chocou especialmente. Numa determinada aldeola, junto a uma espécie de grutas que dão para um precipício e que estão conotadas com a bruxaria e as coisas diabólicas em geral, a população adquiriu o hábito de atirar do precipício todos os que se aproximassem das ditas grutas, ao grito de: “Atirem todos que Deus saberá distinguir os misericordiosos!”
Mas o livro é muito mais que isto. É a vida de Mayo e Ederra, percorrendo caminhos e fazendo encantamentos e feitiços (não são inventados, são fórmulas e receitas da época, algumas ainda hoje usadas). É o choque e a sensação de perda de Mayo quando ficou sozinha. Esta parte está tão bem escrita que praticamente pude sentir as mesmas sensações físicas que ela sentiu e a mesma angústia. A forma como o seu mundo mudou quando se apaixonou. É também todo o mundo interior do inquisidor Salazar, as suas dúvidas que foram dando origem a terríveis certezas. A sua própria paixão impossível. E muito muito mais.
Um livro realmente excelente!
.

A Pedra Abençoada, Barbara Wood

.

.
Toda esta obra é um belo desfilar de personagens, vidas e realidades históricas. O livro pretende contar a história da humanidade a partir do percurso de uma misteriosa pedra azul, começando nos tempos mais remotos da pré-história. A pedra, que resultou do embate de um meteoro com a superfície terrestre, nos primórdios do tempo, foi passando de mão em mão ao longo dos tempos, tendo marcado todos os seus donos, pela sua extrema e beleza e pelos poderes mágicos que estes invariavelmente lhe reconheceram.
O livro está dividido em cerca de oito capítulos, cada um contando uma história, num diferente momento do tempo, sendo o denominador comum a presença marcante da pedra, que acaba por influenciar decisivamente, para o bem e para o mal, o destino dos que a têm na sua posse.
Todas estas pequenas histórias me cativaram, pois embora sejam curtas e, por isso, nalguns casos, pouco desenvolvidas, estão escritas de uma forma extremamente emotiva e têm personagens com personalidades bastante singulares e vidas cheias de interesse.
Um dos factores que mais me agradou neste livro foi a grande variedade de épocas retratadas. Gostei particularmente da descrição da vida e dos hábitos dos primeiros seres humanos e da difícil evolução verificada aos longos dos milénios, bem como da vida na Roma Imperial, pois são realidades com as quais eu nunca me tinha deparado em romances históricos. A autora termina a narrativa apenas no século XIX, dando-nos a conhecer as duras condições em que milhares de americanos emigraram para o Oeste do continente. Entretanto, vai-nos dando a conhecer distintos tempos e lugares, desde um mosteiro inglês medieval até uma ilha paradisíaca assolada por piratas no século XVII, entre muitos outros.

In Nomine Dei, José Saramago

.

.

Gostei muito deste peça de teatro. É passada no século XVII e descreve o percurso do protestantismo na cidade alemã de Munster. Descreve a tomada forçada das Igrejas pelos luteranos e a progressiva conquista do Conselho Municipal, assim como as chacinas protagonizadas por ambos os lados. Termina com o cerco da cidade pelos católicos.
Ao longo da peça vemos todo o tipo de aberrações, como homens que afirmam receber mensagens directamente vindas de Deus. E os outros acreditam (!) e, desse modo, são obedecidos e respeitados incondicionalmente. O objectivo tanto de católicos como de protestantes e colocar a cidade no caminho de Deus, o que só pode ser feito matando e expulsando todas as pessoas com crenças diferentes, neste caso, apenas ligeiramente diferentes mesmo. A tolerância e a compaixão são introduzida na obra apenas pelas mulheres. Quanto aos homens, todos acreditam que Deus quer que exterminem os seus inimigos, que são também os inimigos de Deus!
Um aspecto que me surpreendeu e me chocou foi o facto de a maioria das personagens acreditarem de tal modo na sua religião que quase todas preferiram morrer a renunciar a ela. Estou-me a lembrar por exemplo de uma mulher que tentou matar o bispo católico, sabendo de antemão que logo que o conseguisse seria ela também morta. Que as pessoas usassem a fé para subir socialmente e apoderar-se do poder é o que mais se vê e acho que já não surpreende ninguém, agora as pessoas morrerem por não querer negar as suas crenças é uma coisa que não me cabe na cabeça.

O Leitor, Bernhard Schlink

.

.
A história é narrada na primeira pessoa por um homem que, em adolescente, se apaixonou por uma mulher mais velha e com ela viveu uma relação amorosa e que, misteriosa e repentinamente, desapareceu. O narrador volta a encontrá-la anos mais tarde, num tribunal, como ré num processo de acusação de ex-guardas de campos de concentração nazis.
Talvez tudo que se segue pretenda reflectir sobre o sentido da vida ou a falta dele. O Leitor é um dos livros mais desconcertantes que conheço. Apesar de ser um texto curto, que li em menos de uma noite, é intenso e revoltante. Antes de iniciar a leitura, vi as críticas que estão na contra-capa. “Uma pérola negra”, afirma o Jornal Expresso. Esta frase intrigou-me bastante, mas agora que li o livro parece-me que é a definição mais aproximada possível deste.
.

Monte dos Vendavais, Emily Brontë

.
.


..

No início do livro, um homem, Mr Lockwood, no ano de 1801, aluga uma rica casa desabitada, excepto por uma governanta, que servia os seus antigos moradores, num local isolado do campo inglês. O seu senhorio, Mr Heathcliff, possuiu uma outra casa, afastada alguns quilómetros, um pouco mais modesta, num lugar designado Monte dos Vendavais, devido às tempestades e ventos fortes que, no Inverno, continuamente o assolam.
Os habitantes do Monte dos Vendavais formam uma família de tal modo bizarra, em que todos parecem odiar-se mutuamente, que Mr Lockwood decide interrogar a sua governanta, Mrs Dean, a propósito da sua história. E a narrativa desta é algo de fantástico.
Mrs Dean começa a contar que, há muitos anos, o patriarca da família do Monte dos Vendavais, Mr Earnshaw, regressou de uma viagem a Liverpool com um pequeno rapaz que lá encontrou perdido e resolveu adoptar, a que chamaram Heathcliff. Este embora idealizado e amado pelo pai e pela irmã, Catherine, é desprezado pelos restantes elementos da casa, em especial por Hindley, o filho legítimo, que constantemente o humilha e lhe promete expulsá-lo da casa assim que o pai morra. Quando isto acontece, Hindley assume o controlo da casa e procura afastar Catherine dele, relegando-o para o lugar de simples empregado agrícola. A sua relação, apesar de intensa, começa a deteriorar-se cada vez mais. Um dia cada, Heathcliff regressa e as suas intenções, apesar de primeiro parecem muito pouco claras ou até ingénuas, depressa se revelam as piores.
Este foi um livro que me conquistou. Concordo totalmente com a designação de obra-prima. O cenário é maravilhoso. A forma como a história é contada, por quem de perto a viveu e nela interferiu, os seus comentários sobre as personagens, é maravilhosa. O enredo em si é apaixonante. Começou com uma paixão que acabou por interferir na vida de duas famílias, transformando a vida de todos os seus elementos. Trata-se de uma história não só de amor, mas também de muito ódio, sendo que estes dois sentimentos caminham lado a lado ao longo do livro. As personagens são tão complexas quanto apaixonantes e capazes de coisas incríveis, não parando de nos surpreender. Assim como a trama em geral, o final também é inesperado.

.

Olá pessoal!

.
Depois de alguns meses de ausência e sem visitar este espaço, apeteceu-me voltar a escrever opiniões sobre livros e partilhá-las aqui. Vou publicar algumas opiniões que já escrevi e não coloquei aqui e depois irei actualizando o blog á medida que for lendo.
Obrigada ás pessoas que entretanto foram deixando comentários (que ainda não li mas irei fazê-lo) e se tornaram seguidores do blog.
.